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quinta-feira, 29 de março de 2012

Fins de Março

Os dias sucedem-se rumo ao nada, semelhantes a buracos negros da não-matéria. Uns dizem que andam neles a governar, prosápia; outros dizem que se andam a governar, estultícia; os restantes, muitos, esperam encostados às paredes virtuais, de éter, que aconteça a coisa que lhes devolva a emoção, chão, sol, nuvens; enfim recrie o cenário em que o olhar, hoje próximo da cegueira, recupere nitidez e o embaciado ambiente se esvaia.


terça-feira, 20 de março de 2012

A troika, a saúde e cada um

O Guardian, jornal inglês, diz na versão online de ontem, entre outras coisas, algumas das que se pensam por cá sobre o estado da saúde do pagode. Diz o periódico que “Portuguese death rate rise linked to pain of austerity programme”. Tive uma prenda de aniversário menos boa, a notícia de um AVC sofrido pelo meu “fader in ló”. Longe, nada podendo fazer, segui o incidente à distância. Já cá, pude então seguir os acontecimentos do labirinto que espera um cidadão na circunstância. Num primeiro momento os afectados por um AVC têm uma assistência de qualidade. Contudo, assim que mexem as pestanas são transferidos para hospitais de rectaguarda com enfermarias onde se misturam todos os tipos de doença. Aí começa o calvário para o enfermo e família (quando esta não zarpa e abandona definitivamente o doente no Hospital). Infecções várias juntam-se ao debilitado doente do AVC; o Hospital faz entretanto um ultimato à família: têm meia hora para levar o vosso doente para casa; as casas não estão preparadas para receber o pobre; inicia-se a louca procura de solução; o Sistema Nacional de Saúde, que diz que não tem vagas; os hospitais privados, que não aceitam questões difíceis; os hospitais privados de gama alta (sim que isto da saúde é para quem paga) torcem o nariz, medem a carteira, uma cunha resolve a acomodação com custos incomportáveis por muito tempo. Esta opção se funciona ajuda, se não funciona o enfermo (a família, porque o enfermo continua ainda a levitar nas nuvens da doenaça e das drogas), fica sob o espectro do desfecho final. Em Fevereiro finaram-se mais 20% do que o normal.

Quero que o Guardiam não tenha tenha razão quando a terminar o artigo diz "Portuguese cannot be expected to remain stoical for ever. "I think it will explode eventually," she said. "It is impossible for people to remain this passive". A she referida é a historiadora Irene Flunser Pimentel.


sábado, 3 de março de 2012

Comemoração adiada

Neste sábado esperava comemorar o fim da seca no Alentejo. O céu chegou a estar muito nublado, prometendo copiosa chuvada à meia tarde. Promessa não cumprida, as nuvens desapareceram não se sabe porque artes de mágica. À falta de outros eventos comemoremos como o faz Vinícus de Morais.

Porque hoje é sábado

Neste momento há um casamento
Porque hoje é sábado
Hoje há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado
Há um rico que se mata
Porque hoje é sábado
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado
Há um espetáculo de gala
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado
Há um grande espírito-de-porco
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado
Há criançinhas que não comem
Porque hoje é sábado
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado
Há uma tensão inusitada
Porque hoje é sábado
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado
Há um noivo louco de ciúmes
Porque hoje é sábado
Há um garden-party na cadeia
Porque hoje é sábado
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado
Há um frenesi de dar banana
Porque hoje é sábado
Há a sensação angustiante
Porque hoje é sábado
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado
Há uma comemoração fantástica
Porque hoje é sábado
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado

E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado
Há a perspectiva do domingo
Porque hoje é sábado

(Vinícius de Morais)


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